Lembranças do meu pai




A lembrança mais antiga que eu tenho, é de um fato ocorrido quando eu tinha pouco mais de dois anos.
Estava brincando no quintal da nossa casa, com uma amiga mais velha, quando ela se pendurou numa jardineira (floreira), que enfeitava uma das janelas da casa, e a jardineira despencou. Na queda, a jardineira raspou minha perna direita e provocou uma fratura.
Nessa época, já éramos cinco irmãos e o caçula tinha alguns meses. Minha mãe providenciou para que meu pai fosse chamado no seu trabalho, e logo depois ele estava chegando em casa.
Colocou-me no seu carro e levou-me ao médico. E é justamente essa a minha lembrança mais antiga : eu sendo levada ao médico, por meu pai.
Um mês antes da minha fratura, meu irmão Beto (Gilberto) havia “quebrado” o braço. Lá foi meu pai, levá-lo ao médico.
E muitas foram as outras ocasiões em que ele precisou socorrer algum filho, por motivo de acidente, ou as ocasiões em que levou um grande susto.
O Sérgio estava assistindo futebol, atrás do gol, num campinho próximo ao colégio, quando a trave caiu e alcançou sua cabeça. Susto. 
O Beto (olha ele novamente), estava com a mão sobre o portão de ferro da nossa casa, daqueles que têm setas na parte superior, quando outro irmão inadvertidamente empurrou o portão, e a lança perfurou sua mão. 
O Carlos estava andando de bicicleta, quando levou um tombo e o pedal denteado provocou um ferimento na cabeça.
A Norminha, entre 7 e 8 anos, tropeçou perto da cristaleira e caiu, quebrando o vidro que lhe fez um corte grande em uma das pálpebras (levou vários pontos). 
A Olguinha, aos 7 anos, furou um dos pés com um prego enferrujado, e desmaiou depois das dificuldades para tomar a vacina na barriga, acompanhada por ele.
Muitos sustos.
Mas talvez a ocasião mais preocupante tenha sido quando o Carlos (olha ele de novo), que deveria ter perto de 13 anos, depois de ficar em pé no estribo do bonde antes que ele parasse, acabou levando uma queda forte que o levou ao hospital e o deixou desacordado por muitas horas.
Cruzes! Quanta correria com os filhos.

Quando éramos estudantes, não usávamos despertador. 
Meu pai dormia cedo, e acordava cedíssimo, e gostava de nos chamar para nossos compromissos. 
Na época dos exames semestrais e finais, alguns de nós tinham por hábito estudar e repassar a matéria de madrugada, antes da ida para a escola. Para que ele soubesse o horário em que queríamos levantar, deixávamos bilhetinhos presos no espelho do banheiro. 
Ele chamava, pela ordem, quem deixara escrito que queria ser acordado às 5 horas (às vezes, antes), 6 horas, 6:30 horas ... 
Nos intervalos entre as chamadas, sentava-se na sua cadeira de balanço.
Cadeira de balanço. Quantas lembranças. Ainda o vejo, muitas vezes, balançando-se lentamente, com uma das pernas sobre um dos braços da cadeira.

Quando nasceu seu nono filho, meu irmão caçula, meu pai estava com 45 anos e 7 meses. Ficou preocupado e recomendou a um dos meus irmãos mais velhos que cuidasse do caçulinha, caso ele faltasse. Quando ele faltou, aos 75 anos, o caçulinha estava formado cirurgião-dentista há algum tempo, e já era pai.

Uma das minhas últimas lembranças, talvez numa reunião de família, com todos juntos, é a de ouvi-lo falar, com mais de 70 anos : “não sei como dei conta de criar nove filhos”.






Texto publicado no dia 09/08/2008, no Dia dos Pais, agora editado e republicado.


Comentários

  1. Que lindo texto e recordações. Nove filhos são muito!!!" E que bom que temos recordações seles em mais variados moimentos! Saudades ficaremos deles pra sempre! beijos, tudo de bom,chica

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  2. Em tempos em que não havia celular, ele devia tremer quando o chamavam de casa ao telenone, no trabalho. Alguém a ser socorrido.

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  3. Adorei o texto, querida Heloísa! Que família linda e grande. O pai, sempre presente, tratando das "emergências, sempre que elas ocorriam.. Não havia tédio aí em casa, kkk.
    Bjn
    Márcia

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    1. É verdade, Márcia. Nunca tivemos tédio, principalmente quando a família foi aumentando ainda mais, com a chegada dos netos.

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  4. Mais uma linda história! Fiquei até arrepiada, pq conheço todos os “heróis”... vou até ler novamente, obrigada!

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  5. A foto da família está linda! E tidas as “ocorrências” tiveram um final feliz...

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  6. Olá, Helô,

    Lindo texto, uma homenagem de primeira ao seu pai. A paternidade (incluo a maternidade neste termo) nos sujeita a muitos desafios e tribulações, quantos sustos e quantas lutas, até podermos contemplar o filho crescido e bem criado! As pessoas das gerações passadas tinham que se haver ainda com o esforço enorme, exigido para a criação de um número grande de filhos. Mas algumas, como o seu pai, se saíram muito bem nesta árdua tarefa.

    Um beijo

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  7. Oi Heloísa, obrigada pela visita no Pinceladas...Adorei por aqui e já estou seguindo.
    Menina, que turminha, heim...quantos sustos!
    Já não se fazem mais famílias grandes, a da minha mãe eram em 11 irmãos, achava isso inacreditável!
    Amei a foto de família, tantas histórias...
    Abração!

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